sábado, 4 de maio de 2024

O legado de Eliézer para o teatro paraibano

21, fevereiro, 2022

O teatro da Paraíba, feito na Paraíba, escrito na Paraíba, pensado na Paraíba, tem muito a agradecer a Eliézer Rolim. O grande diretor e pensador dessa arte milenar acaba de nos deixar órfãos, digo órfãos porque quem trabalhou com Eliézer se sentia um pouco filho dele pelo carinho com que lidava com os atores e pelo amor que tinha pela arte.

O teatro da Paraíba perde muito sem Eliézer. Perde a sua plasticidade cênica, um teatro limpo que mais parecia cena de cinema. Cinema, aliás, que viria a ser uma de suas paixões.

Após o anúncio da morte de Eliézer na tarde deste 2 de fevereiro de 2022, muito tem se falado e escrito que a Paraíba perdeu um Cineasta. Sim, perdeu também um cineasta, mas antes de tudo, perdeu um homem de teatro, alicerce para todo o resto de sua arte. Eliézer também era professor do Departamento de Arquitetura da Universidade Federal da Paraíba – UFPB.

Falar sobre Eliézer é meio que dividir o tempo entre o Eliézer Filho e o Eliézer Rolim, embora estejamos falando da mesma pessoa. O Filho nos remete ao teatro e o Rolim, ao cinema.

Eliézer Filho, como assinava anteriormente (veio adotar o Rolim depois do cinema) trazia da infância sua “brincadeira” de teatro. Nem imaginava o grande pensador e encenador que se tornaria. Foi em Cajazeiras, Sertão da Paraíba, ainda no início dos anos 80 que, junto com os Lira (Buda, Nanego, Soia, Paula e outros Lira) e os Cartaxo (Marcélia e sua irmã, que agora me foge o nome) que iniciou o Grupo Terra e produziu a peça “Beiço de Estrada”, talvez o primeiro experimento de Eliézer no teatro.

Foi com esse espetáculo que a atriz Marcélia Cartaxo viu as portas se abrirem para a consagração no cinema nacional. Em turnê com o Projeto Mambembão em São Paulo, Marcélia, dirigida por Eliézer, foi vista em cena pela diretora Suzana Amaral, que lhe convidou para fazer o filme “A Hora da Estrela”, com o qual viria a conquistar o Urso de Prata de Melhor Atriz no Festival de Cinema de Berlim.

Estabelecido em João Pessoa a partir dos anos 80, Eliézer não parou mais de produzir. E quantos espetáculos maravilhosos nossos olhos puderam ver no palco do centenário Teatro Santa Roza! O grande sucesso de “Mamanita”, que tinha no elenco atores como Walmar Pessoa, João Dantas, Patrícia Braz, Criselide Barros e Celsa Monteiro (me desculpem se esqueci alguém do elenco) nos fazia viajar nas imagens que somente Eliézer era capaz de fazer. Ao final do espetáculo, sobrinhas puxadas ao fio de nylon subiam e desapareciam do palco, como se estivessem ganhando o universo. Isso tudo com a iluminação perfeita (acredito que de Eloy Pessoa) e a voz afinada da atriz Patrícia Braz.

E o que dizer do estrondoso sucesso de “Como Nasce Um Cabra da Peste”, que ainda hoje encanta plateias em todo o Brasil. Eliézer reuniu no palco três dos maiores atores da Paraíba: Edilson Alves, Madalena Acyole e Dadá Venceslau. Um grande sucesso que mostra a essência nordestina em cena, numa peça que revela o momento de nascimento do segundo filho de uma família pobre, com suas dificuldades e seu cotidiano na seca do Nordeste. O texto é de Altimar Pimentel e a direão de Eliézer Filho.

Ainda no teatro, Eliézer nos presenteou com momentos magníficos, entre eles o deslumbrante espetáculo “Sinhá Flor”, com duas maravilhosas e grandes atrizes paraibanas em cena: Criselide Barros e Celsa Monteiro. Além disso, tem os espetáculos “Drops do Halley”, por ocasião da passagem do Cometa Halley em 1986 (espetáculo que cheguei a ensaiar, mas não continuei no elenco por questões de horário de trabalho), “Anjos de Augusto”, “No Tempo da Chrestomathia”, “Paixão de Cristo, Segundo o Anjo da Presença”, “Efemérico” e tantas outras maravilhas pensadas, criadas e encenadas pelo grande Eliézer Filho.

No cimena, quando passou a adotar o nome de Eliézer Rolim, foi roteirista e diretor de filmes como “Eu Sou o Servo” e “O Sonho de Inacim”. Bem mais recente, teve sua peça “Beiço de Estrada” roteirzada e filmada, também com sua direção.

SOBRE ELIÉZER

Eliézer Leite Rolim Filho nasceu em Cajazeiras. Era graduado em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal da Paraíba UFPB (1986), tinha mestrado em Artes Cênicas pela Universidade Federal da Bahia (2001) e atuou na área de cinema como produtor roteirista e diretor. Era ainda membro da Academia Paraibana de Cinema, doutor em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal da Bahia (2010-2013) e realizou Estágio no laboratório Le Cresson na École Nationale de Architecture de Grenoble, na França. Sua pesquisa e trabalho era com temas ligados à espetacularização urbana, teatro, cenografia, “ambiances” espetaculares e espaço teatral.