quarta-feira, 8 de maio de 2024

A BOLA PERFUMADA

14, outubro, 2022

Imaginem vocês uma criança que não pode jogar bola, porque a mãe proíbe.

Como já disse, minha mãe me proibia de jogar. Era uma luta para praticar as peladas do Campo do Óleo. Era preciso esperar um descuido de minha mãe, para… Záz! Escapulir.Para acabar de acertar, minha mãe odiava que eu jogasse de goleiro. Avisava: “No colégio, se o professor de Educação física inventar jogo, não jogue de goleiro”. “Mas por que, mamãe?” “Vem uma bola, bate no seu olho e você cega. Tudo, menos jogar de goleiro”.O pior é que eu adorava jogar de goleiro. Adorava ser comparado a meus ídolos, Celimarcos e Menininho; ambos, goleiros do Esporte de Patos; o último, mais “parecido” comigo, porque, como eu, era baixinho.

– Já viu goleiro baixinho!?

– Já; e Menininho?

Um dia, dei uma lição em quem achava que goleiro baixinho não prestava. Numa disputa para ver quem seria o titular do time de handebol do Estadual de Patos, Bastinho, o técnico e introdutor desse esporte na cidade, me escolheu para titular. E isso após um grande embate como Jônathas (Biriba), que parecia com Zé Pereira, goleiro do Nacional. Após muitos treinos, Bastinho me escolheu, e eu dei o maior show, numa memorável tarde de torneio, na quadra do Estadual, quando Patos conheceu o handebol.

Mas e a bola perfumada?

Explico-lhe, leitor apressado.Toda a Peregrino de Araújo zombava porque eu não saía de casa e, principalmente, porque não jogava bola com meus colegas. O motivo o leitor já sabe. A coisa chegou a tal ponto, que inventaram uma rifa, comandada por meu tio Jones, em que, depois eu soube, forjaram uma sorte para mim e eu “tirei” a rifa.Foi uma verdadeira festa, na Peregrino de Araújo.

– E aí, João! Ganhou a bola hein? Quando é que a vamos jogar com ela?Era a pergunta que eu fazia à minha mãe. “Quando vou jogar com meus colegas?” “Quem mandou você ganhar bola em sorteio? Joga não. Principalmente, porque soube que você está jogando de goleiro”.

Toda a Peregrino de Araújo passou a zonar comigo. Um dos colegas espalhou a “notícia” de que eu, toda noite, colocava perfume na bola e dormia abraçado com ela; não jogava para não gastar. No dia seguinte, para aonde eu andava:

– E aí, João? Cadê a bola perfumada? Não adiantou de nada a gente fazer a rifa.Desisti de brincar de bola. Principalmente porque, num dia em que jogava na Peregrino de Araújo, um colega acertou um “tuba” no meu olho direito. O leito da rua estava encharcado, e a mistura de lama, terra e água me fez passar três dias sem poder enxergar direito.

(Crônica transcrita do meu livro “O Estranho Professor de Violão”, que será lançado dia 27 de outubro de 2022, no auditório da OAB, às 17 horas).