quarta-feira, 8 de maio de 2024

A escravidão do “passe”

31, março, 2023

Talvez por ser uma criança diferente, “intelectualizada” e emotiva em excesso, era, desde menino, revoltado com a instituição do “passe”. Principalmente quando via jogadores de times pelos quais torcia deixarem de crescer, indo para clubes maiores, porque tinham o “passe preso” com determinada equipe.

Minha revolta ficou maior ainda quando vim morar aqui, em João Pessoa, com 14 anos de idade, em 1971. Soube, por intermédio de alguns colegas, que alguns dirigentes inescrupulosos aliciavam jovens, iludindo alguns pais de pouco conhecimento e, às vezes, até analfabetos, e, quando o jovem crescia, eles não deixavam assinar com determinado clube, porque o passe era daquele time (na verdade, deles).

Para o bem do futebol brasileiro, essa escravidão se acabou com o advento da Lei 9.615/98 (Lei Pelé), que, no artigo 28, institui, como obrigatoriedade, o passe livre.

A lei que leva o nome do rei tem, originalmente, alguns exageros; por esse motivo, foi aperfeiçoada por novas normas; principalmente pela Lei 10.672, de maio de 2023, que deu nova redação aos artigos 28 e 29, mitigando o protecionismo que fora instituído pela Medida provisória 2141/01. O direito de preferência para a primeira renovação do contrato voltou a prevalecer sobre as indenizações de formação e de promoção.

Em resumo, é o seguinte:
Até a edição da “Lei Pelé”, o esporte brasileiro sofria com uma carência de legislação específica. No futebol, as relações entre atletas profissionais e clubes eram reguladas pelas disposições da Lei 6.354/76, que instituiu o “passe”, no artigo 11 do referido diploma.

Para os clubes, o “passe” era legítimo, pois representava uma espécie de premiação pela formação do atleta e também pela visibilidade que dava a ele, permitindo sua valorização e posterior transferência de agremiação.

Já na visão do atleta, correta, do nosso ponto de vista, o “passe” representava uma verdadeira prisão, uma vez que não tinha a liberdade de disponibilizar a própria “força de trabalho”, ficando “nas mãos” dos clubes.

Como já foi destacado, a mais importante inovação trazida pela “Lei Pelé” foi o fim do instituto do “passe” no ordenamento jurídico brasileiro, legitimando o “passe livre” no nosso ordenamento jurídico, no artigo 28 da referida lei, que teve alterações no texto original e atualmente tem a seguinte redação:

Art. 28. A atividade do atleta profissional, de todas as modalidades desportivas, é caracterizada por remuneração pactuada em contrato formal de trabalho firmado com entidade de prática desportiva, pessoa jurídica de direito privado, que deverá conter, obrigatoriamente, cláusula penal para as hipóteses de descumprimento, rompimento ou rescisão unilateral.