quarta-feira, 24 de abril de 2024

Violência no futebol: aspectos sociais e sociológicos

25, março, 2022

Na coluna passada, abordei os aspectos jurídicos da violência no futebol. Nesta, falo sobre algo tão importante quanto e que tem relação direta com o lado jurídico: a violência social e sociológica. Para tanto, valho-me de um texto de um dos maiores teóricos da comunicação no Brasil, o jornalista Muniz Sodré, publicado na coluna dele, na Folha de São Paulo. Diz o mestre, no início do texto:

“Há algo além de simples incidentes colaterais na multiplicação de episódios de violência, de tiros a bomba caseira, por parte de torcidas de futebol em várias capitais brasileiras.
Não é nenhuma novidade enxergar no jogo de bola um lugar de representações sociais que circulam no campo ideológico das diferentes classes na formação social brasileira. Simbolicamente, ele sempre capitalizou aspectos de uma ideologia populista difusa, em que se misturam anseios de entretenimento com ascensão social.”
E conclui, magistralmente:

“Futebol é tão só pretexto para que a violência se automatize, reduzindo o tempo de um cotidiano insuportável à expressão mais simples de um instante, o ato destrutivo. Isso ainda talvez seja parte de um jogo cênico, de vocação delituosa. Apenas falta a esse ator a coragem do bandido.”

Diante das sábias palavras de um dos nossos maiores teóricos da comunicação, como já afirmei no início do texto, de imediato lembrei-me daqueles episódios de violência fora de campo, em que verdadeiras gangues, disfarçadas de “torcida organizada” (não me refiro, é óbvio, a todas) e vestindo a camisa do clube, algumas delas recebendo até dinheiro por parte da agremiação para se deslocar para um jogo noutra cidade e tendo acesso gratuito a campo, muitas vezes com ingresso pago pela diretoria do time. O que são esses grupos, senão a encarnação do que foi dito no final do texto de Muniz Sodré? E o pior: não falta a eles a coragem do bandido, embora não sejam vistos, oficialmente, como tal.

E o Ministério Público, sobretudo o da Paraíba, ainda insiste em, abusando do poder, instituir esse tal de “jogo de torcida única”, ignorando que a violência em campo não é patrocinada, verdadeiramente, por quem está dentro dele, mas sim fora, punindo o verdadeiro torcedor, e tendo uma visão excessivamente estreita das causas da violência no futebol.